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CAPA

EDITORIAL
Nesta edição, um grande debate sobre a propaganda de medicamentos de venda livre


ENTREVISTA
Polêmico e verdadeiro, o cineasta Ugo Georgetti fala sobre futebol. Imperdível!


CRÔNICA
Pasquale Cipro Neto: texto sempre bem-humorado e incontestável quando o foco é nosso idioma...


CONJUNTURA
Telemonitoração, Telehomecare, Telecirurgia Robótica. A Medicina Digital já é realidade


MEIO AMBIENTE
Edwal Campos Rodrigues, infectologista, alerta p/a necessidade de normatização na fiscalização de resíduos hospitalares


SINTONIA
Conheça um pouco da vida de Camilo Salgado, cultuado como santo popular no Pará


DEBATE
Debate sobre a propaganda de medicamentos: Sim ou Não?


HISTÓRIA DA MEDICINA
Hospital Santa Catarina: dedicação e perseverança desde sua fundação, em 1906


GOURMET
Não duvide: tem médico à frente de tradicional padaria no Bixiga...


EM FOCO
Vamos rodar pela Transamazônica numa expedição dedicada à saúde?


ACONTECE
Uma visita educativa - virtual - ao Museu da Língua Portuguesa


CULTURA
José Bertagnon: médico pediatra e artista premiado internacionalmente


TURISMO - CHILE
Viaje conosco até o Chile e conheça Puerto Williams e Porvenir. Inesquecíveis!


CARTAS & NOTAS
Pesquisa Datafolha mostra que a Ser Médico tem 100% de aprovação


LIVRO DE CABECEIRA
Sugestão de leitura para quem gosta de histórias de terror realista: Colapso...


POESIA
A poesia "Civilização Ocidental", de Agostinho Neto, finaliza com brilho esta edição


GALERIA DE FOTOS


Edição 35 - Abril/Maio/Junho de 2006

ENTREVISTA

Polêmico e verdadeiro, o cineasta Ugo Georgetti fala sobre futebol. Imperdível!

Ugo Georgetti
Por Antonio Pereira Filho e Ivolethe Duarte*

"Para ser jogador de futebol profissional, o sujeito deve ter algo muito especial. Ele pode ser inculto, mas essa brincadeira não é para qualquer um"

O cineasta Ugo Georgetti, de 64 anos, utilizou o futebol como pano de fundo para fazer uma crônica sobre a sociedade brasileira em dois filmes. O primeiro, Boleiros – era uma vez o futebol foi lançado em 1998. O segundo, Boleiros 2 – vencedores e vencidos, entrou em cartaz este ano, pouco antes do início da Copa do Mundo. Neles, o diretor expõe a falta de ética e a corrupção do país de forma caricata, além de fazer uma crítica ácida à mídia e à sociedade de consumo. Dono de uma produtora, o palmeirense Georgetti também faz documentários e filmes publicitários “para ganhar a vida”. Entre os dois Boleiros, rodou o longa Príncipe. Antes disso, dirigiu os filmes A Festa e Sábado, entre outros. Ele diz que os brasileiros falam demais sobre futebol, que já está um pouco cansado do tema, embora o esporte seja assunto recorrente de sua coluna no jornal O Estado de S. Paulo. Nesta entrevista à Ser Médico também não conseguiu escapar do assunto.

Ser Médico: Por que razão o futebol foi escolhido como tema de dois de seus filmes?
Ugo Giorgetti:
Sempre tive interesse pelo jogador de futebol. Tanto pela origem, quanto pela maneira como ele subitamente desponta, já que não é uma carreira construída paulatinamente. A vida de um jogador pode mudar completamente em dois meses, quadriplicando o seu salário. Em geral, ele é uma pessoa que vive em condições muito desfavoráveis e, então, passa a enfrentar a torcida – muitas vezes, cruel e exigente –, a concorrência, as contusões, o técnico, os rumores do técnico, a má fase do time. Ele cai no meio de uma profissão extremamente complicada e competitiva. Para ser jogador de futebol profissional, sobretudo de um grande time, o sujeito deve ter algo muito especial. Ele pode ser inculto, o que for, mas essa brincadeira não é para qualquer um. Fora a arte e o talento que são outros aspectos importantíssimos. O que eles fazem é uma arte! Claro que realizar uma leitura do Brasil via futebol é uma pretensão do filme também. Tudo o que está na sociedade, está no futebol de forma quintuplicada; se a sociedade é cruel, o futebol é crudelíssimo; se a sociedade é competitiva, o futebol é três vezes mais. O futebol é uma visão da sociedade com as tensões levadas às extremas conseqüências. É um tema profundamente brasileiro.

Ser: A que se deve tanto talento para futebol no Brasil?
Ugo:
Há muita coisa envolvida, uma delas é, inegavelmente, o componente negro. Os africanos vão dar trabalho de novo neste mundial. O negro não tem talento apenas para o futebol, mas para todos os esportes, o boxe, o basquete. Nas corridas eles são imbatíveis. Esse componente não só nos torna melhores, mas diferentes, porque na Argentina só existem jogadores brancos e eles são bons também. Acho que os brancos que jogam futebol no Brasil aprenderam com os negros, eles vêem e fazem igual. Mas também somos bons porque é um esporte democrático, é preciso ter apenas uma bola, pode-se jogar de qualquer jeito, não precisa ter físico. O moleque pode chegar raquítico que o físico é fabricado com o tempo. Não precisa ser alto, forte, depende mais de habilidade. 

Ser:  O futebol ainda tem influência sobre a política e os resultados das eleicões ou é algo desconectado?
Ugo:
O futebol não tem muita influência política sobre as eleições, a não ser para o bem do Lula. Mas acho que ele vai ganhar mesmo se o Brasil perder a Copa do Mundo. Se o Brasil ganhar vai ser bom para o Lula porque ele faz parte desse universo popular, fala com qualquer pessoa da rua. Agora, não dá para imaginar o (Geraldo) Alckmin falando de futebol, não é? Hoje o futebol está mais instrumentalizado do que nunca, só que mudou de dono. Em vez do governo, são as empresas como a Nike, Adidas, a TV Globo que mandam. O futebol é totalmente manipulado. Essa euforia  em torno da Copa do Mundo que você vê quando liga a televisão, não existe nas ruas. De vez em quando, vemos alguém passando com uma bandeirinha, mas é raro. Banco não trabalhar é uma coisa ridícula! Isso começou nos anos 70 e foi crescendo. Em 58, 62 e 66 os jogos não eram televisionados. Ao mesmo tempo, futebol é um esporte de muito apelo, porque as pessoas param. Uns porque não querem nada com nada, outros por causa da paixão mesmo e outros porque todos param. Eu gostaria que fosse mais espontâneo. Comparados aos argentinos e italianos, perdemos no fanatismo. 

Ser: O primeiro filme “Boleiros” aborda algo folclórico, que é a questão do sexo às vésperas de uma partida de futebol.
Ugo:
Os técnicos evitam, não por causa do sexo ou da mulher, mas porque vem acompanhado de outras coisas: bebida, passar a noite em claro. Mas no filme, esse é um episódio cômico e, ao mesmo tempo, não. É uma história de malandragem. Não acho que essa questão “sexo” tenha muita profundidade no filme, a não ser quando visto pela maneira como um jogador exerce poder sobre o outro, o que é uma violência. (No filme, o jogador mais experiente obriga o jovem colega de quarto dormir no terraço numa noite fria, enquanto ele fica em companhia de uma mulher. No dia seguinte, o jovem, gripado, não entra na partida).  

Ser: Os personagens desses filmes parecem ter sido inspirados em pessoas reais. Ao mesmo tempo, as histórias acontecem dentro de times reais e muito conhecidos. Isso trouxe alguma dificuldade?
Ugo:
São histórias que eu ouço, não são inspiradas nesta ou naquela pessoa especificamente. Por exemplo, para essa história de sexo na concentração, houve um caso no Palmeiras em que eu pedi licença para usar a camisa, mas foi um transtorno. O Palmeiras é um time tão complicado como o Corinthians, porque ninguém te recebe, é uma confusão. O único time que realmente recebe a gente para uma conversa franca, do tipo “isso pode, isso não pode, tudo bem” é o São Paulo. Na época que eu estava rodando o filme, um dirigente de clube disse: “ah, isso (sexo na concentração) não acontece mais, jogador hoje é super profissional, disciplinado”. Logo depois estourou um escândalo, com uma briga horrorosa na concentração por causa de mulher. Claro que isso continua acontecendo. Veja o caso da boate em que os escalados para a Copa freqüentaram. Não é nada, mas o Roberto Carlos mentiu candidamente à imprensa: “não saí do hotel”. Claro que tinha saído.

Ser: Em uma das cenas do filme, há uma crítica ao modelo de programas esportivos da televisão. Os apresentadores do programa não deixam o jogador convidado falar.
Ugo:
O melhor para o futebol é as pessoas esquecerem dele. Esqueça o futebol e ele volta a ser uma coisa magnífica. O número de gente que tem lá é incrível! Quatro caras adultos, com mais de 40 anos, comentando um treino! Os jogadores parecem uns imbecis que têm 11 anos. É muito desagradável. Em 70, o jogador de futebol era um homem que jogava e pronto. Não ficava pulando em frente às câmeras. É de um infantilismo ficar gesticulando e atuando perante a câmera. Estou me contendo para não escrever sobre o fato de os jogadores fazerem o sinal da cruz para qualquer coisa que aconteça.

Ser: Em geral, os jogadores vêm das classes de menor poder aquisitivo e têm, no futebol, uma das poucas chances de mudar de vida. Então, que atitude esperar desses garotos?
Ugo:
Aqueles jogadores que estão lá ganharam na loteria da vida, não é? Milhares e milhares têm um salário ruim. Não quero ser injusto com os jogadores porque gosto muito deles. Mas sinto um ódio momentâneo. Eles são reflexo da sociedade idiota em que vivemos. O pessoal que freqüenta a noite de São Paulo é mais inteligente que o Ronaldinho? É igual ou pior. Eles copiaram esse procedimento de alguma elite. O jogador famoso tenta se enquadrar naquilo que vê, repetindo aquilo que assistiu na TV.   

Ser: A violência em torno do futebol também é um reflexo da sociedade? Hoje é difícil pensar em ir ao estádio assistir a um clássico que reúna duas grandes torcidas. No passado, não se dividia torcidas nos estádios.
Ugo:
No estádio mesmo não há maiores problemas porque tem policiamento. Eles brigam lá fora. Os idiotas da Mancha Verde marcam encontro com os da Gaviões no metrô. É um problema da sociedade de massa, por isso não tem fim. E a massa vive na periferia. É pobre batendo em pobre. Quem se incomoda com isso? Um dia morre um, comenta-se nas mesas-redondas à noite. No dia seguinte, tchau. As torcidas organizadas são um grande problema, mas são gente nossa. O que vamos fazer com eles? Matar? Não deixar mais entrar no estádio? Fazer o quê com essa gente?

Ser: Qual é a sua avaliação do atual modelo do cinema brasileiro?
Ugo:
Para mim, é péssimo, porque estamos criando uma grande farsa. Deveríamos chegar à população e dizer: vamos parar com esse negócio de mercado. Se queremos cinema, por alguma razão, devemos entender que ele não dá lucro, que deve passar na televisão para  retribuir ao povo que paga impostos. Deve-se encontrar mecanismos para levar o cinema gratuitamente ou a um preço bom à população. Por que não se faz uma rede de cinema no Interior? O aparato cinematográfico não existe mais. Se as prefeituras tivessem interesse, alugariam telões na praça. Nenhum jogador que eu conheço vai ao cinema. Passei o filme Boleiros 1 para eles no Bar do Elias, que funcionava quase em frente ao Palmeiras. O segundo passei em um bar que se chama Boleiros, na Vila Olímpia. Não podemos fingir que temos mercado. Qual é o sentido de fazer um filme como Os Normais igual ao programa que passa na televisão, para ser visto por três milhões de pessoas?

Ser: A referência do cinema brasileiro ainda é a do período dos filmes de Glauber Rocha. Era ele quem fazia a diferença ou era uma época diferente?
Ugo:
As circunstâncias históricas eram diferentes. Havia o cinema com um determinado fim, para um determinado público. Mudou para pior. O Glauber era um contestador do sistema. Em que lugar do país ele iria buscar dinheiro para fazer cinema? Um cara com independência e rebeldia não tem mais lugar. Como vai fazer um filme minimamente polêmico? Onde vai conseguir dinheiro para isso? Imagine chegar para o patrocinador e dizer que somos contra os bancos, contra a sociedade do consumo. O cara vai dizer: “você tá louco!”. E tem toda razão, o que é pior. Como você quer que o cara te arme contra ele?

Ser: O que acabou nivelando a televisão brasileira por baixo?
Ugo:
A televisão começou bem, com (Assis) Chateaubriand que era o que era, mas fundou o Masp. Não era um primata. Paulo Machado de Carvalho era de razoável nível, Roberto Marinho era jornalista. A TV fica mal a partir da ditadura. Quando acabou a TV Tupi deveria ter sido providenciado outro canal de mesmo nível, mas daí veio Sílvio Santos, o pessoal da igreja, porque não queriam nenhuma voz dissonante. Roberto Marinho era conservador, alinhado ao regime, mas empregou Dias Gomes, de esquerda; Bráulio Pedroso, excelente escritor de novela. Nos bons dias da Globo, algumas novelas foram interessantes, depois criaram esses monstrengos que estão até hoje educando a população brasileira. E o pior é que a TV Cultura entrou nessa também. A TV a cabo é o fim do mundo. Prefiro assistir ao Ratinho – pelo menos ele diz a verdade – do que aquela velha no GNT falando de sexo. Fico indignado com a TV fechada, que você paga e ainda tem que ver comerciais. Esses caras estão nos fazendo de idiotas.

* Antonio Pereira Filho é reumatologista, diretor de Comunicação do Cremesp
* Ivolethe Duarte é jornalista, editora da revista
Ser Médico
 


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