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CAPA

EDITORIAL (SM pág. 1)
A mobilização nacional para a revisão do Código de Ética Médica, após 20 anos de existência do documento - por Henrique Carlos Gonçalves


ENTREVISTA (SM pág. 3)
Acompanhe a trajetória profissional e pessoal da pediatra marroquina Najat M’jid nesta entrevista exclusiva


SINTONIA 1 (SM pág. 8)
Web e atividade cerebral: nosso bem ou nosso mal? Tire aqui suas conclusões...


SINTONIA 2 (SM pág. 11)
Jornalismo na área da saúde: é preciso saber separar o joio do trigo antes de divulgar assuntos médicos


CRÔNICA (SM pág. 16)
Príncipe ou plebeu... qual opção lhe traria maior felicidade?!? Veja o que pensa Ruy Castro, em sua crônica, sempre inteligente e bem-humorada


AMBIENTE (SM pág. 18)
Alguns hospitais brasileiros são bons exemplos de atitudes positivas e eficazes na preservação da qualidade do meio ambiente


DEBATE (SM pág. 23)
Encontro sobre violência infanto-juvenil reúne duas especialistas no assunto, sob a mediação do conselheiro Mauro Aranha


EM FOCO (SM pág. 29)
Estação Ciência: passeio transforma visita em experiência única, possibilitando o contato direto - e descomplicado - com o universo científico


HISTÓRIA (SM pág. 32)
Acompanhe nossa visita virtual aos templos ecumênicos agregados a hospitais


CULTURA (SM pág. 36)
A arte e a ciência - que desafiam a lógica - do artista holandês Cornelius Escher


TURISMO (SM pág.40)
Casal de médicos dá dicas incríveis para uma viagem fantástica ao Parque Nacional da Serra da Canastra, em Minas Gerais


CABECEIRA (SM págs. 46 e 47)
Duas sugestões de leitura imperdíveis: O Presidente Negro e Venenos de Deus, Remédios do Diabo


CARTAS (SM pág. 47)
Acompanhe, nesta coluna, alguns comentários recebidos sobre a edição anterior


POESIA (SM pág. 48)
Trecho da obra Réquiem, II, do poeta Lêdo Ivo, foi escolhido para finalizar esta edição


GALERIA DE FOTOS


Edição 46 - Janeiro/Fevereiro/Março de 2009

ENTREVISTA (SM pág. 3)

Acompanhe a trajetória profissional e pessoal da pediatra marroquina Najat M’jid nesta entrevista exclusiva

Najat M’jid



Por amor às crianças

Por Concília Ortona*

Há tempos as trajetórias pessoal, profissional e, por que não dizer, emocional, da pediatra marroquina Najat M’jid vinculam-se à luta pela inclusão de crianças exploradas e em situação de rua: doze anos atrás ela fundou a Organização Não-Governamental (ONG) Bayti (algo como “Meu Lar” em árabe, idioma oficial do Marrocos), que atua junto aos pequenos vulneráveis e seus familiares. Tamanha dedicação a promoveu a referência sobre o assunto: em 2000, por exemplo, atuou como consultora do premiado filme As Ruas de Casablanca, em que os meninos Ali, Kwita, Omar e Boubker protagonizaram seus próprios papéis: os de vítimas do abandono, moradores de rua de uma grande cidade. Em junho de 2008, a médica – formada na França, e que jamais deixou de exercer sua profissão – precisou enfrentar outro desafio, ao ser nomeada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como Relatora Especial sobre a Venda de Crianças, Prostituição e Pornografia Infantis. Tal função trouxe recentemente a dra. M’jid ao Rio de Janeiro, onde participou de congresso mundial voltado a encontrar soluções contra o abuso de menores. Pouco depois, a pediatra concedeu esta entrevista exclusiva.
Confira, a seguir.

Ser Médico: Fale-nos um pouco a respeito de sua vida profissional e dedicação à filantropia. Por que escolheu a pediatria? De que forma a especialidade encaminhou-lhe ao campo do combate à violência contra crianças pobres, que vivem nas ruas?
Najat M’jid:
Optei pela pediatria porque adoro crianças. Além disso, trata-se de uma especialidade que permite ao médico não apenas prestar cuidados de saúde aos pequenos, como também a aconselhar os pais, levando em conta o ambiente socioeconômico e o relacionamento entre os membros daquela família. Atuar como pediatra, me permite, ainda, acesso fácil às crianças em situação de rua: além de cuidar da saúde delas, consigo construir um relacionamento forte com meus atendidos. Eles confiam em mim. Sei que conciliar meu trabalho, militância e âmbito pessoal não é algo fácil, porque acabo não deixando tempo suficiente para mim mesma... Porém, escolhi esta vida e me sinto feliz com ela: encho-me de energia ao observar crianças exploradas e excluídas no passado, agora tendo chances de proteção e de integração.

Ser: Quais são os principais fatores que contribuem ao abuso e à exploração de crianças?
M’jid:
Existem vários, entre eles: a privação do ambiente familiar ou a vivência de problemas familiares, como a morte dos pais, divórcio, o fato de serem filhos de mães solteiras, de pais presos e/ou viciados em drogas ou bebidas alcoólicas, de presenciar ou passar por violência doméstica; pobreza e falta de trabalho dos pais e/ou nenhum (ou dificuldade de) acesso à moradia, educação, saúde, justiça; e normas sociais específicas que levam à discriminação contra as mulheres, a casamentos precoces e a tabus relativos à sexualidade.

É curioso observar que o HIV/Aids aparece como causa e consequência da exploração sexual de crianças, pois existe o mito cultural perigoso de que o sexo com crianças pequenas previne a Aids (particularmente na África). A doença ainda é responsável pelo aumento marcante do número de órfãos e de crianças que chefiam suas casas, mais vulneráveis à exploração sexual. Contribuem ainda para os problemas de violência e exploração de crianças e adolescentes o trabalho infantil, falta (ou insuficiência) de serviços de proteção à criança, consumismo exacerbado, desenvolvimento da indústria do sexo, e até desastres naturais, guerras e destituição de poder de algumas populações; além da impunidade aos contraventores.

SER: Pode-se imaginar que o abuso de crianças ocorra tanto em países desenvolvidos quanto em nações em desenvolvimento? Existem variações entre explorações ocorridas nesses dois contextos?
M’jid:
É bastante difícil dar uma resposta, por causa da falta de informação relativa à magnitude e às formas de exploração sexual. Por exemplo, ainda não tenho uma avaliação clara sobre seu país, o Brasil, pois comecei como representante especial das Nações Unidas sobre venda, prostituição e pornografia envolvendo crianças e adolescentes em junho de 2008. Porém, fica claro que a exploração sexual de crianças e adolescentes ocorre em todos os países.

No entanto, menos em nações cuja legislação é harmonizada com os instrumentos internacionais de proteção a tal universo; quando as leis são bem conhecidas por todos; e nas quais a exploração sexual de crianças é criminalizada e onde os perpetradores são fortemente condenados. E, também, é menor naquelas que propiciam às crianças e adolescentes acesso fácil a serviços sociais de proteção e a mecanismos de denúncias que garantam sua confidencialidade e anonimato; ou em países que respeitem os direitos de todas as crianças, sem discriminação de qualquer ordem.

SER: A exploração sexual costuma ser mais frequente entre meninas do que entre meninos. Em que grau a base desta violência reflete a discriminação contra a mulher na sociedade, e em que grau reflete a pobreza das nações? É possível separar estes dois componentes, quer dizer, a discriminação contra a mulher da pobreza?
M’jid:
Evidentemente, a exploração sexual afeta um número maior de meninas e mulheres, por conta da discriminação ao contingente feminino – basta observar a alta porcentagem de meninas/mulheres estupradas durante as guerras, a frequência do tráfico de garotas para prostituição etc. A pobreza sempre torna mulheres e crianças mais vulneráveis a todas as formas de abuso, exploração e violência, mas vale lembrar que os garotos também se tornam vítimas de turismo sexual e de prostituição... Em muitos países, tabus relativos à homossexualidade levam, como consequência, à redução da quantidade de informações vinculadas a tais assuntos.

SER: Qual é hoje o perfil dos exploradores/abusadores? Esses dois personagens, o abusador e os pais, são frequentemente a mesma pessoa? Como prevenir exploração e abuso no contexto familiar?
M’jid:
Não existe um perfil típico: qualquer criança e/ou adolescente pouco informado, ou privado de proteção, pode ser abusado ou explorado. Num enfoque de incesto, infelizmente, os abusadores podem ser, sim, pais e parentes. No contexto familiar, a prevenção da exploração e do abuso baseia-se em mecanismos de detecção precoce acessíveis às crianças; em aconselhamento e programas de orientação para famílias com dificuldades econômicas e sociais ou marginalizadas; cuidados alternativos direcionados a crianças provenientes de lares complicados; e em campanhas de conscientização dos familiares, centralizadas em suas comunidades.

SER: No Brasil é considerado politicamente incorreto referir-se à “prostituição infantil”: as pessoas preferem dizer “exploração sexual infantil”. Para a senhora, essas duas classificações possuem o mesmo sentido?
M’jid:
A prostituição infantil é apenas uma forma  de exploração sexual de crianças. Refere-se ao uso do menor para atividades sexuais, visando remuneração e outros tipos de compensação. O problema é que o termo “prostituição” obscurece a natureza do comportamento sexual abusivo, apontando erroneamente ao conceito de consentimento. Isto, de algum modo, pode sugerir que as crianças e adolescentes concordam com o abuso, ao invés de colocá-las em seu lugar, que é o de vítima.

SER: Para evitar que crianças e adolescentes sejam explorados e traficados, os esforços deveriam ser dirigidos aos seus pais e familiares, diretamente aos abusadores ou aos governos? Por quê?
M’jid:
É preciso direcionar as medidas a todos, especialmente às crianças, buscando prevenção, proteção, recuperação e reintegração. Obviamente, parte do empenho deve voltar-se aos pais e familiares, com aconselhamento e empoderamento do núcleo familiar; aos próprios abusadores, em forma de tratamento e criminalização; e aos governos, com políticas públicas efetivas e estratégias de proteção à criança.

Tais políticas e estratégias funcionam, sim, contanto que ajudem a elevar a conscientização e a implementar efetivamente a legislação; aumentem o grau de informação e propiciem treinamento de pessoal; bem como, facilitem o acesso das crianças aos serviços sociais. É válido ainda incentivar mecanismos de denúncia e de extraterritorialidade, o fim da impunidade e o acesso controlado à Internet.

SER: Falando-se em Internet, qual é o papel que a rede mundial de computadores ocupa, em termos de riscos de violência contra as crianças? Tais riscos são factíveis ou a Internet serve apenas para evidenciar aqueles que já existem?
M’jid:
O fácil (e não controlado) acesso à Internet de crianças e jovens aumenta as chances de exploração sexual, por meio de conversas com pedófilos em chats. Facilita também o tráfico e o turismo sexual, bem como o desenvolvimento da pornografia infantil. Entre as ações necessárias para proteger os menores se incluem a conscientização da própria criança e de seus familiares quanto aos perigos inseridos na rede de computadores e o controle do acesso a determinados espaços virtuais, além do envolvimento das companhias de Internet e do treinamento de profissionais na batalha contra a criminalidade virtual.

SER: Em um artigo, o cineasta Nabil Ayouch, compatriota da senhora, elogiou seu apoio à produção do filme Streets of Casablanca (Ruas de Casablanca). De que maneira a divulgação desta triste realidade pode ajudar as crianças focalizadas e os grupos vulneráveis?
M’jid:
Trata-se de um filme cujo diferencial é o fato de algumas crianças em situação de rua interpretarem seu próprio dia-a-dia. A Bayti, ONG à qual coordeno, foi parceira durante toda a realização da obra, que teve um impacto eficiente, mudando a opinião e aumentando o entendimento do público a respeito deste fenômeno, e mostrando como vivem e o que pensam as crianças em situação de rua. A experiência foi positiva também às crianças porque, de alguma forma, conseguiu apontar a elas metas para o futuro – coisas das quais estes pequenos sentem enorme falta.

SER: Para terminar: seria utopia imaginar um mundo sem exclusão social, num contexto de tanta iniquidade e crises como o nosso? Por onde poderíamos começar a trabalhar, no sentido de reduzirmos as enormes diferenças presentes entre crianças ricas e crianças pobres?
M’jid:
Isso é um sonho e todos nós teríamos que mudar nossa mente, nosso comportamento e estarmos mais envolvidos na tarefa de mudar a sociedade.

Frases

“O HIV/Aids aparece como causa e consequência da exploração sexual infantil, pois existe o mito cultural perigoso de que o sexo com crianças pequenas previne a Aids (particularmente na África)”

“Para evitar que crianças sejam exploradas sexualmente
é válido incentivar mecanismos de denúncia e de extraterritorialidade, o fim da impunidade e o acesso controlado à internet”


* Concília Ortona é jornalista do Centro de Bioética do Cremesp.


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