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E U R O P A


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A atuação de recém-formados em regiões distantes do país


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O descarte e a reutilização de materiais


HISTÓRIA DA MEDICINA (pág. 27)
Por Renato M.E. Sabbatini*


GIRAMUNDO (págs. 30/31)
Curiosidades da ciência e tecnologia, da história e da atualidade


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Acompanhe as novidades que agitam o mundo digital


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O Conto da Ilha Desconhecida - André Scatigno*


CULTURA (pág. 38)
INHOTIM - Todos os sentidos da arte


CARTAS & NOTAS (pág. 43)
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TURISMO (pág. 44)
Na Garupa de um Motociclista...


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Sophia de Mello Breyner Andresen


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Edição 56 - Julho/Agosto/Setembro de 2011

HISTÓRIA DA MEDICINA (pág. 27)

Por Renato M.E. Sabbatini*

Craniologia: a pseudociência médica

Os historiadores dizem que a medicina foi a última das ciências naturais a se desenvolver. De fato, no começo do século XIX várias delas, como a física, a astronomia e a química, tinham status bem estabelecido há 100 anos ou mais. A medicina, no entanto, ainda lutava para se livrar de diagnósticos baseados na antiga teoria grega dos humores, e de métodos terapêuticos bárbaros, como a sangria, a cauterização de feridas com óleo fervente, e “medicamentos” empíricos absurdos, como raspa de caveira de enforcado misturada com baba de morcego, e coisas do gênero.

O método cientifico experimental, tão bem solidificado por cientistas como Galileu, Newton e Lavoisier, entre outros, simplesmente não era empregado na medicina. Quando começou a ser (mal) utilizado, gerou alguns “monstrinhos”, que hoje sabemos ser pseudocientíficos. Tinham cara de ciência séria, mas geravam interpretações e aplicações totalmente errôneas.

A craniologia, a fisiognomia e a caracterologia, assim como a frenologia, foram algumas dessas pseudociências médicas e antropológicas que chegaram a gozar de extremo prestígio, e ficaram em voga por muito tempo, mas foram jogadas na lata de lixo da história da ciência médica.

Frenologia
A frenologia foi a primeira a surgir e a ditar a tendência que, mais tarde, constituiu o que chamamos de craniologia. Foi desenvolvida por um médico alemão chamado Franz Joseph Gall (1758-1828), e depois consolidada e divulgada por vários colegas, entre os quais o mais importante foi Johann Spurzheim (1776-1832), outro médico alemão. As pesquisas de Gall se baseavam em um preconceito comum na época, o de que o grau de inteligência era relacionado ao tamanho do cérebro. Muitos neurologistas importantes, como o francês Paul Broca, pai da antropologia, gastaram muito tempo tentando provar se isso era verdade.


Retratos de criminosos políticos", segundo Lombroso

Gall levou essa crença ainda mais longe. Ele pensava ter descoberto, de maneira científica, a correlação entre 37 faculdades mentais particulares e elevações e depressões na superfície do crânio ósseo, suas formas exteriores e dimensões relativas. Explicava essas marcas externas do crânio como resultado da hipertrofia de determinadas estruturas cerebrais internas,  que estaria relacionada ao desenvolvimento de faculdades mentais associadas. Tudo muito lógico. Em um século em que a ciência médica e a biologia procuravam se libertar das influências da religião, a frenologia gerou um grande entusiasmo entre aqueles que achavam que a alma, as virtudes e os vícios, as emoções e a razão dos seres humanos eram unicamente determinados por leis naturais, que decorriam do cérebro e da evolução, e não dos imperativos divinos.

Se tivesse parado por aí, seria apenas uma teoria sem muita sustentação real. Mas Gall, e principalmente Spurzheim, como bons médicos, foram além. Usaram os mapas frenológicos para diagnosticar características mentais e psicológicas das pessoas, com base em um método simples e fácil – porém totalmente subjetivo –, a palpação dos calombos no escalpo e sua identificação nos mapas preparados.

Com isso, “consultórios frenológicos” espalharam-se rapidamente na Europa e nos Estados Unidos no ápice desse movimento, entre 1820 e 1842. Pessoas usavam a frenologia para tudo. No final do século XIX, no entanto, ficou claro que ela não tinha bases científicas, e que se transformara em mais um tipo de charlatanismo. Os cientistas sérios se distanciaram dela, que acabou morrendo. Contudo, inacreditavelmente, ainda hoje existem autodenominados “especialistas” que trabalham, falam, ensinam e escrevem sobre os aspectos “científicos” da frenologia. Infelizmente, no entanto, ela deu origem a muitos outros ramos pseudocientíficos.

Craniologia
Uma das muitas pseudociências sucessoras da frenologia foi a craniologia, que advogava o uso de medidas quantitativas precisas das características cranianas, a fim de classificar pessoas de acordo com a raça, temperamento criminal, inteligência etc. Ela se tornou influente durante a era vitoriana, e foi usada, pela primeira vez, pelos britânicos para justificar o racismo, a colonização e o domínio sobre o que se denominava na época como “raças inferiores”, tais como os irlandeses e tribos negras da África.

Tipos raciais foram classificados de acordo com o grau de prognatismo ou ortognatismo. Raças “inferiores” eram ditas prognáticas, tais como os chimpanzés e macacos, de modo que eram consideradas como mais próximos a esses animais do que os demais europeus.

A generalização final – uma das mais nocivas e absurdas de todas – não tardou muito a ocorrer: a avaliação “científica” das características de personalidade baseada na aparência, graças ao  médico, antropólogo e criminologista italiano Cesare Lombroso (1835-1909). Sua teoria sobre antropologia criminal associava determinadas características corporais ao tipo de criminoso. Por exemplo, ele achava que os assassinos tinham maxilas proeminentes, e que os batedores de carteira tinham mãos longilíneas e barbas ralas.
 
Lombroso foi uma personalidade altamente influente nos sistemas judicial e policial da Itália, e em muitos outros países, inclusive no Brasil. Aqui, ainda na década de 1950, muitos juízes ordenavam a realização de análises antropométricas “lombrosianas” dos réus em processos criminais, que posteriormente eram usados pela acusação em julgamentos! Inacreditavelmente, o lombrosianismo é ensinado até hoje em algumas faculdades de direito, embora as teorias baseadas na causa ambiental da criminalidade tenham se tornado dominantes.

Antropometria
Um uso infamante e mais bem conhecido da antropometria pseudocientífica foi feito pelos antropólogos e médicos nazistas, os quais, no Departamento de Higiene Racial do Ministério do Interior e no Escritório para o Esclarecimento da Política Populacional e Bem-Estar Racial, propuseram a classificação de arianos e não arianos com base nas medidas quantitativas do crânio.

Essa ideia de que existiria uma raça superior de arianos, e que os povos germânicos a constituiriam, foi resultado de pseudoteorias raciais totalmente inventadas por escritores, como o Barão de Coubertin, e mal digeridas por teóricos do nacional-socialismo, como Alfred Rosenberg. Hitler e seus asseclas, notórios antissemitas, as acolheram de braços abertos, pois assim “justificavam” suas políticas criminosas de extermínio de todos os que não eram considerados arianos, ou seja, os sub-homens (Untermenschen).

Milhões de inocentes foram massacrados como consequência da aplicação consciente dessa grotesca pseudociência. E o mais impressionante, com a cumplicidade de centenas de cientistas e médicos, como o famoso Josef Mengele, e a maioria deles nunca foi punida por seus crimes. Isso tudo nos faz refletir muito sobre o papel nocivo da ciência médica, quando é deturpada pela ideologia aliada à pseudociência.

(*) Renato M.E. Sabbatini é graduado e doutorado em neurofisiologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. Professor adjunto aposentado do Depto. de Genética Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Escreve e ensina sobre história da medicina, especialmente das neurociências. Email: renato@sabbatini.com



Os botocudos e a craniologia

     No século XIX existiu um intenso comércio de crânios de indígenas (e também viventes) do Brasil, alimentado por instituições científicas europeias que faziam pesquisas baseadas na craniologia.

     Um dos que foram levados daqui foi o índio borun (“botocudo”) chamado Kuêk, amigo do naturalista alemão príncipe Maximiliano de Wied, que o teria levado para a Alemanha, em 1818. 

Mas, o botocudo, ainda vivo, acabou sendo objeto de estudos de craniometria nas universidades alemãs: os indígenas da América do Sul seriam “o elo perdido entre o homem e o macaco”. Era preciso prová-lo.

Kuêk era da região do Baixo Vale do Jequitinhonha (MG) e, depois de quase 200 anos, seu crânio, que estava guardado no Museu de Anatomia da Universidade de Bonn, na Alemanha, voltou à sua terra natal. No mês de maio último, por ocasião dos festejos do seu bicentenário, a cidade de Jequitinhonha conseguiu a restituição do crânio do botocudo, entregue à sua tribo, Krenak, que procederá às exéquias segundo suas crenças e rituais.



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